"É na adversidade que nasce a força". O ditado já é antigo mas teve aplicação prática em 2015, com a equipa do Barcelona. Viviam-se tempos muito complicados (o fantasma de Guardiola ainda pairava, a morte de Tito Vilanova não fora esquecida...) e uma conjuntura altamente desfavorável (más exibições, polémicas e proibição de contratar jogadores a meio do ano). No entanto houve coragem para mudar. O 'velho' Tiki Taka já não estava capaz para estas andanças e estes jogadores. No novo Barça havia um trio de Sul-Americanos que ditava as regras do ataque Catalão. Para a história fica o segundo Triplete em menos de 10 anos.
Texto de José Silva
O fim de ciclo
O final da temporada 2011/12 foi angustiante para o FC Barcelona. Os Catalães foram eliminados nas meias-finais da Liga dos Campeões em pleno Camp Nou e viram o arquirrival Real Madrid bater vários recordes a nível interno. Mas o pior vinha depois. No dia 27 de Abril de 2012 Pep Guardiola anunciava o seu adeus aos Blaugrana. Para trás ficaram quase quatros anos (como treinador da equipa A) em que conquistou tudo o que havia em disputa e habituou o público da Catalunha ao melhor futebol que se viu em anos. A saída de Pep (em final de contrato) não se deveu aos insucessos no último ano nos azuis grená, mas sim à pressão que vinha a sentir e ao facto de alguns jogadores se aproximarem do fim de carreira. Aproximava-se um fim de ciclo e Guardiola não o queria presenciar.
À procura de Rumo
O que se seguiu não foi propriamente uma rotura com o Tiki Taka, já que o escolhido para o comando técnico do Barça foi Tito Vilanova... adjunto de Guardiola. Dessa forma os Cúles mantinham a sua identidade de pressão alta, futebol associativo e construção a partir de trás. O jogo exterior passou a ser utilizado com mais frequência, muito por culpa da velocidade de Tello.
Na primeira época pós-Guardiola o Barça arrecadou 'La Liga' (igualando o recorde de pontos pertencente ao Real Madrid), mas na Europa foi humilhado pelo Bayern Munique, que os levou de vencidos por 7-0 (no total da eliminatória). Ficava cada vez mais à vista que o meio campo dos Catalães, em especial Xavi, estava envelhecido e já não carburava como antes.
O reforço Neymar e o adeus a Tito
No meio da instabilidade surgiu uma boa notícia. Em Maio de 2013 o Barcelona ganha a corrida a grandes colossos da Europa, garantido o promissor Neymar JR. Tinha tudo para ser um ponto de viragem no humor dos adeptos Cúles…mas não foi. Em Julho do mesmo ano, Tito Vilanova demite-se do clube para se dedicar à luta contra um cancro nas glândulas parótidas. Infelizmente o treinador Espanhol iria deixar o mundo dos vivos meses depois, vítima da doença. Para o seu lugar entrou Tata Martino que não conseguiu impor o seu estilo de jogo, conquistando apenas uma Supercopa.
O novo Tiki Taka e o MSN
Luís Henrique chega a Barcelona com uma missão hercúlea. O balneário estava destroçado pela morte de Tito e pela má performance desportiva do ano anterior. A juntar a isso, não era certa a continuidade de Xavi Hernández, Puyol tinha acabado de se retirar e Luís Suárez (recém contratado ao Liverpool) encontrava-se suspenso por 4 meses na sequência de uma dentada a Chiellini num jogo do Mundial de 2014. Ainda assim, o treinador Espanhol levava vários anos de Barcelona (enquanto atleta e treinador da equipa secundária) pelo que não teve receio em prometer um futebol atrativo na apresentação. Apesar do início ter sido prometedor, fruto das sete vitorias e um empate nos primeiros oito jogos, as derrotas com PSG (Liga dos Campeões), Real Madrid e Celta de Vigo (La Liga) aumentaram a contestação.

Mas pouco a pouco Henrique soube equilibrar o modelo de jogo entre o controlo com ataques posicionais e os contra ataques mortíferos. Paralelamente, soube explorar ao máximo a parceria entre Messi, Neymar e Suarez. Se é verdade que três jogadores não fazem uma equipa, também é verdade que este trio se destacou no futebol mundial pelos golos (364), assistências (173) e títulos (9), pese embora nunca tenham faltado momentos de magia durante o período em que coabitaram na Catalunha.
De volta ao topo da Europa
Mesmo sendo, como habitual, grandes favoritos a conquistar a 'Champions', a equipa do Barcelona não entrou na competição com o fulgor que a sua história exige. Apesar de terem vencido cinco dos seis encontros da fase de grupos, o nível exibicional tardava em convencer. Contudo garantiram o primeiro lugar à frente de PSG (França), Ajax (Holanda) e Apoel (Chipre). Na fase eliminar tiveram pela frente equipas que gostam de assumir o jogo, o que lhes deu a oportunidade de explorar o espaço nas costas. Os primeiros foram o Manchester City (Inglaterra), que ainda sonharam na primeira mão, quando Messi falhou o penalti que sentenciaria a eliminatória, mas que perderam as esperanças com a derrota por 1-0 no segundo encontro. Seguiu-se o PSG, de novo, numa eliminatória que ficou marcada por momentos de alto nível do trio maravilha do Barcelona e de Luís Suárez em particular. Para as meias finais estava agendado um reencontro entre Guardiola (Bayern Munique) e o Barça. Ambos tentavam provar que são capazes de ganhar na Europa um sem um outro. O génio de Messi e um golo de Neymar perto do fim deram a vantagem (3-0) do Barça para a segunda mão. Em Munique, num jogo marcado por boas exibições de ambos os guardiões, perderam por 3-2, o suficiente para carimbar o passaporte para a final. No derradeiro jogo, em Berlim, enfrentavam-se dois históricos do futebol Mundial - Barcelona e Juventus (Itália). Com a curiosidade de ambas as equipas terem jogadores à procura do último grande título da carreira - Buffon, Tévez ou Pirlo, do lado da Juve e Xavi ou Iniesta no lado Azul Grená. No final o placard registou um 3-1 para o Barça, que significava levantar a sua quinta Liga dos Campeões.
Reis da Copa e a despedida de Xavi
Para a história ficou ainda a conquista da Copa do Rey, numa campanha em que venceram todos os nove jogos realizados. Na final enfrentaram o Athletic Bilbau, de Marcelo Bielsa, que derrotaram por 3-1 com (mais) uma grande exibição de Messi. Nota ainda para a despedida de Xavi Hernández, que deixou o clube pelo qual alinhou em mais de 700 jogos e conquistou 25 títulos, com destaque para quatro ligas dos Campeões e oito (!) Ligas Espanholas.
Como jogavam

Outros jogadores:
Cláudio Bravo (GR);
Mathieu (D); Vermalen (D); Adriano (D);
Xavi (M); Rafinha (M); Sergi Roberto (M);
Pedro (A);
No processo ofensivo Luís Henrique trouxe algumas alterações em relação à tatica utilizada por Guardiola. A posse de bola era mais objetiva, as saídas para o ataque eram mais rápidas e os contra ataques letais. O jogo exterior era cada vez mais utilizado, devido ao declínio de Xavi e Iniesta. Em contrapartida no jogo interior eram privilegiadas as jogadas ao primeiro toque ou as incursões de Messi. Iniesta tinha uma visão periférica do jogo e dominava-o como ninguém. Xavi era fundamental pelos seus passes e porque definia o ritmo de jogo. Rakitic, que era muito completo, aparecia bem em zonas de finalização.
Quando perdiam a bola a ordem era para recuperá-la, pelo que faziam uma pressão alta. Sem bola a linha defensiva subia até ao meio campo, os médios faziam marcações cerradas aos seus oponentes do meio terreno e os avançados procuravam incessantemente recuperar a bola e tapar linhas de passe. Luís Suárez era incansável na pressão ao portador da bola. Quando o adversário subia até à sua área, o Barça optava por deixar apenas dois homens (normalmente Messi e Suárez) na frente. Os restantes jogadores formavam um bloco compacto e com apoios defensivos bem posicionados.
O ponto forte era sem dúvida o contra-ataque. A defender, os três homens mais adiantados do Barcelona posicionavam-se estrategicamente a meio campo, à espreita do contra-golpe. Quando recuperavam a posse procuravam Messi que transportava a bola até à área adversária ou recriava-se com os seus companheiros de ataque. No apoio ofensivo era habitual juntar-se um quarto homem (ou um dos laterais, quando a bola era colocada na largura, ou um dos médios, quando a solução encontrada era o jogo interior). As tabelas e jogadas rápidas eram muitas vezes utilizadas.
Após alguns anos a tentar 'espremer' o Tiki Taka sem resultados práticos, o Barcelona percebeu que o caminho era outro. Luís Henrique soube fazer a mediação entre o domínio com bola e o pragmatismo, o que lhe valeu uma liga dos campeões, duas La Ligas ou um Mundial de Clubes. Contudo, nos últimos tempos em Camp Nou, mostrou-se muito agastado, principalmente pelos fracos resultados a nível Europeu. Saiu no fim da temporada 2016/17, pois sentiu que "já não tinha mais nada para dar". Uma coisa é certa, Luís Henrique está na história do Barça por ter conquistado o segundo Triplete do Palmarés do clube.
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